domingo, 3 de novembro de 2013

Estreando com a Qualidade e o Toque Impecável de Quem tem Mais de 50 Anos nos Palcos dos Teatros Brasileiros



     No dia 25 de outubro de 2013, estreou mais um espetáculo do experiente e consagrado Valter Sobreiro Jr. Com uma carreira de mais de 50 anos trabalhando como encenador, dramaturgo, iluminador, cenógrafo e demais atividades que compõem a construção de espetáculos de artes cênicas, Valter nos presenteia com Pai-de-Deus, uma peça de teatro esteticamente diferente de alguns dos seus renomados sucessos.

     Não vou me ater ao padrão de qualidade dos espetáculos de Valter Sobreiro Jr., pois já o fiz em outra crítica publicada aqui neste blog http://criticasparateatro.blogspot.com.br/2013/05/mais-um-excelente-trabalho-de-valter.html. Este diretor, que esteve à frente do Grupo Teatro Escola de Pelotas (TEP) por mais de 20 anos, recebendo dezenas de prêmios em todo o país com as suas peças, agora, com o Grupo Entremez de Teatro, inaugura uma nova fase de produções e repertórios de espetáculos para circularem em território nacional e internacional, como nos trabalhos junto ao Teatro Escola de Pelotas. O TEP alcançou reconhecimento não apenas nos palcos brasileiros, mas também nos países vizinhos. Porém, o destaque na mídia local somente surgiu quando o grupo foi aclamado pelo público e crítica do eixo Rio-São Paulo e do exterior.

     Faço aqui essa referência, pois na mesma noite de estreia da peça Pai-de-Deus, houve o lançamento do livro “O que pode o tempo – Maragato e a consagração de Sobreiro”, escrito por Helena Zanela Prates. Neste livro, a autora faz uma abordagem interessante sobre a maneira como a mídia trata as produções de teatro locais. Além disso, Helena também cumpre um importante papel ao registrar uma parte da história do teatro gaúcho, ao abordar o sucesso da peça “Maragato”, de Valter Sobreiro Jr., levada aos palcos pelo TEP.

     Em Pai-de-Deus, observamos uma história desenvolvida em duas grandes cenas, diferentes entre si, porém, interligadas pela sua essência. Não há uma explicação óbvia para as situações que são apresentadas. O espectador acaba se envolvendo com o universo dos personagens e, aí, compreendendo que todas as histórias são atravessadas por diferentes e complexos contextos e que a visão unilateral dos fatos nos impede de observar os indivíduos dentro de sua complexidade.

     Como em um pas-de-deux, os atores Sérgio Peres e Bernardo Pawlak jogam em cena em uma ótima sintonia. Essa sintonia entre os atores não deixa transparecer as diferenças entre o experiente Sérgio Peres - e seus muitos anos vivendo diferentes personagens nos palcos - e o jovem talentoso Bernardo Pawlak. Ambos os atores estão muito bem, um colaborando com o outro em cena para que o público consiga ser envolvido pela complexidade dos seus personagens.

     O espetáculo foi apresentado na Fábrica Cultural, um espaço novo que começa a se fortalecer no cenário das artes cênicas como uma opção à falta de casas de espetáculo para peças de teatro que não se direcionam às grandes plateias. Além disso, a estrutura do local deve ser elogiada e indicada para futuras apresentações em nossa cidade, pois apresenta um espaço versátil e que pode funcionar como uma excelente opção aos espetáculos que desejam um contato mais íntimo com os espectadores.

     Valter soube tirar o melhor proveito do espaço cênico. Ao colocar o público disposto em cadeiras no palco e os atores no espaço que seria tradicionalmente reservado à plateia, o diretor além de nos propor à reflexão do valor que devemos dar aos nossos espectadores, nos coloca em uma perspectiva que permite avaliar a história como se estivéssemos entrando no interior dos seus acontecimentos.

     Esse tipo de opção estética requer dos atores uma técnica de interpretação que deveria beirar o hiper realismo, dada à proximidade com o espectador e os conflitos dos personagens. Talvez, esse quesito ainda necessite ser ajustado nas opções de estilo de atuação dos atores. Mas, é só uma questão de ajustes, já que ambos têm talento e competência suficientes para obterem resultados cênicos ainda melhores. Essa questão que destaco aqui é muito interessante, pois, geralmente, os atores só conseguem ter a real dimensão do seu trabalho quando as peças saem das salas de ensaio e vão ao encontro dos espectadores para que o evento teatral possa acontecer. Comumente os artistas de teatro costumam dizer que as estreias são momentos de nascimentos das suas peças de teatro e, como tais, os trabalhos e ajustes mais específicos iniciam a partir desse dia.

     A concepção de figurinos, maquiagem e cenário enxutos criaram uma identidade visual ao espetáculo bastante limpa e funcional. Além disso, dada a maneira enxuta como foi concebida, possibilitará ao grupo uma boa versatilidade para apresentarem esse trabalho em diferentes espaços. A direção de palco de Roberta Rangel completa a ficha técnica do grupo.

     Portanto, nascimentos e estréias são sempre bem vindos e, nesse dia, pudemos observar o nascimento de Pai-de-Deus e o belo futuro que ainda tem pela frente. Assim como em todos os seus trabalhos, Valter assina aqui mais exemplo do seu padrão de qualidade e que merece ser assistido por todos.

Vagner Vargas
Ator – DRT: 6606

Crítico de Teatro

Nenhum comentário:

Postar um comentário